Éramos poucos, não mais de meia dúzia. Estávamos reunidos em um domingo à noite para o culto em um projeto de estabelecimento de igreja. Pouco antes do início dos trabalhos, uma senhora, toda tímida, pediu licença, entrou e se sentou. Ela estava com um lenço na cabeça, tinha os olhos fundos e acentuadas olheiras. Sua cor era de alguém que estava doente.

Assim que se sentou, procuramos conhecê-la. Ela informou que havia sido criada na igreja, mas que esta experiência foi traumática. Por não aguentar a quantidade de regras e mandamentos que lhe impunham, ela havia “se desviado” e nunca mais havia colocado os pés em uma igreja. Para ela a igreja era sinônimo de sofrimento. Alguém havia dito a ela que ali se reunia uma igreja diferente.

Ela ficou o tempo todo calada. Percebia-se que estava prestando atenção, mas não tinha coragem de falar, de participar do estudo bíblico, das orações.

Quando já estávamos por terminar, ela, meio sem coragem, mas premida pela angústia, perguntou se podia fazer um pedido de oração. Foi quando pediu que orássemos pela sua saúde. Tinha um tumor cerebral, estava sob tratamento quimioterápico, se sentia mal por estar sem cabelo, não estava se sentindo bem e afirmou acreditar que só Deus podia fazer algo por ela. Oramos. Terminado o culto ela se despediu prometendo que voltaria.

E voltou, não uma, mas muitas vezes. Na segunda vez que veio já voltou com um ar mais animado, mais alegre. Estabeleceu-se um carinho muito grande entre nós e ela, ao ponto de eu começar a chamá-la de “minha carequinha preferida”. A sua cor voltou ao normal, o cabelo voltou a crescer, o sorriso voltou a ser abundante em seus lábios, o ânimo era contagiante. 

Ela teve um tempo bem de saúde e até achegou a pensar que o câncer estava remissivo. Mais de um ano depois a coisa voltou. Novos tratamentos, nova perda de cabelo, nova luta pela vida. Por várias vezes eu a vi nos cultos com um ar de quem estava com dores, mas, ao mesmo tempo alegre por estar em comunhão com outros e com Deus.

Na última vez que ela veio à igreja, ela estava muito debilitada e com fortes dores. Eu lhe perguntei por que tinha vindo. Foi quando ouvi uma das coisas mais profundas e significativas no meu ministério: “vim porque esta igreja me dá colo”.

Aquilo foi um torpedo na minha teologia e na minha forma de entender o pastorado. Quantas vezes preparei sermões, estudos, aulas, citei teólogos e estudiosos. Mas nunca havia me preocupado com os que vinham ao culto porque precisavam de colo. Pessoas carentes de carinho, de ânimo, de apoio, de abraço, de elogio. Elas não vêm para ouvir coisas profundas, mas para serem amadas. Não é uma questão de palavras de ânimo, de fórmulas mágicas ou espirituais de vencer o fracasso, ou a depressão. Não é uma questão de frases feitas, de slogans e lugares comuns, tão usados nas igrejas do sucesso. 

Não é uma questão de teodiceia, é uma questão de amor, de carinho, de colo.

Deus te abençoe,
Pr. Marcos Inhauser

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